Abro o jornal e leio que o dr. Blaiberg permanece vivo e em franca recuperação. O impossível sucede. O coração, a fonte da vida, muda-se de um para outro homem, foge da morte para a vida. E pergunto a mim mesmo se o Homem conseguirá um dia vencer a Morte de um modo definitivo. É estranho e absurdo tudo isto. Transplanta-se um coração. Mas não se cura um eczema. Transplanta-se um rim. Mas não se dão melhoras a um reumático. Abstraindo-nos do problema moral que uma transplantação do órgão vital representa, temos de considerar extraordinário o trabalho do prof. Barnard e da sua equipa. Temos de considerar tão importante esta façanha como a do primeiro astronauta, por isso a queremos pôr no mesmo plano de igualdade. Entretanto, enquanto que relativamente ao lançamento do primeiro astronauta, orientais e ocidentais, adversários de tradição, se encontravam perfeitamente de acordo quanto à real importância de tal feito, no caso do cirurgião da África do Sul, os seus colegas de quase todo o Mundo têm procurado minimizar aquele trabalho, apresentando toda a gama de provas. Mas o dr. Blaiberg sobrevive, e lentamente o silêncio da medicina mundial, silêncio de aprovação e pasmo, vai surgindo, destruindo todos aqueles que, por despeito, pretenderam apoucar uma das maiores vitórias desta segunda metade do século vinte.
Publicado in Jornal de Abrantes em 17/Fevereiro/1968
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